Número de mulheres na construção civil cresce 120%, mas participação ainda é baixa no setor

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Segundo o IBGE, mais de 239,2 mil mulheres trabalham no setor  com a capacitação sendo o principal diferencial delas

Apesar da construção civil e a profissão de pedreiro serem vistos como coisa de homem, este quadro está mudando. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a participação feminina neste mercado aumentou 120% entre 2007 e 2018 ー hoje, são cerca de 239,2 mil mulheres empregadas no setor.

Entre os fatores que explicam este crescimento estão iniciativas como a ONG Mulher Em Construção, criada pela gaúcha Bia Kern em 2006. De lá para cá, o projeto já ajudou a capacitar e empregar mais de 6 mil mulheres no setor.

“Ela viu uma falta de cursos na área voltados às mulheres e um dia decidiu fazer um de pintura de parede. Como teve muita procura, a Bia decidiu investir nessa necessidade do mercado”, explica a Camila Alhadeff, líder da Mulher Em Construção em São Paulo em entrevista ao Censo da Construção Civil Obramax 2023.

Quem é a mulher pedreira?

O perfil destas profissionais é diferente dos homens que atuam na área. Segundo Alhadeff, as mulheres atendidas pela Mulher Em Construção têm em comum o fato de serem pretas, periféricas, chefes de família e que fazem bicos informais.

“A maioria delas são vítimas de violência doméstica, que é um problema de saúde pública e mental. Nosso trabalho é ajudá-las a conseguirem colocação no mercado de trabalho porque com dinheiro no bolso você consegue mudar de vida”, conta.

Por isso, o foco da ONG é realizar oficinas e workshops gratuitos para preparar estas mulheres para entrarem na profissão ー geralmente patrocinados por empresas. Inicialmente focada na construção civil, a Mulher Em Construção expandiu seu horizonte para áreas correlatas como gás, eletricidade e restauro.

Este trabalho não passa só pela parte técnica do trabalho. “Nosso trabalho vai além da capacitação e aborda todo o lado comportamental e psicológico. Sabemos que o mercado é majoritariamente masculino e machista, então temos toda uma trilha que aborda questões como assédio, racismo e a dinâmica cotidiana”, explica Alhadeff.

Capacitação é o diferencial da mulher na construção civil

Como em outras áreas, existe uma divergência salarial entre homens e mulheres ー que ganham 4,2% menos. Mas há uma exceção: Joinville (SC), onde o salário delas é 10,9% maior. Segundo o Observatório da Indústria Catarinense, o motivo é a melhor capacitação.

“Geralmente, a profissão de pedreiro é passada de pai para filho, o que faz o homem ter uma capacitação informal. Já a mulher precisa estudar mais para entrar no mercado, o que a torna mais dedicada e preparada”, conta Alhadeff. Segundo ela, outras características destas profissionais elogiadas pelos empregadores são a maior atenção, capricho e detalhismo ー o que gera menos desperdícios de materiais e retrabalhos.

Como os cursos da Mulher Em Construção são feitos em parceria com empresas, as profissionais geralmente saem formadas e com trabalho garantido. Este pilar do projeto é, segundo Alhadeff, central para prepará-las ao mercado ー cuja atuação sempre é elogiada pelos contratantes.

Segundo estudo realizado pela Obramax, somente 40% dos profissionais da construção trabalham com contrato. Esta questão se traduz, também, no modelo de contratação das mulheres ー que, segundo Alhadeff, tem grande influência na regionalidade.

“No Rio Grande do Sul, as mulheres trabalham de maneira informal. Elas costumam se identificar com a profissão e flexibilidade de ter a própria carteira de clientes, conseguindo conciliar com a maternidade”, explica. Já em São Paulo, Alhadeff aponta que a maioria das mulheres se capacita e consegue um emprego CLT ー geralmente nas empresas parceiras da Mulher Em Construção.

Evolução nas políticas públicas de inclusão ainda é insuficiente

Em Minas Gerais, há uma lei que estabelece a cota de 5% de profissionais mulheres nas obras. Implementada em 2015, a legislação é elogiada por Alhadeff – que luta pela implementação de normas semelhantes em outros estados como São Paulo e Rio Grande do Sul.

No entanto, ela aponta que a questão das cotas não é suficiente por si só para garantir a inclusão das mulheres no mercado. “Ainda temos muito a caminhar, pois temos que garantir a capacitação destas profissionais. Já conversei com empresas que querem contratar mulheres, mas possuem dificuldade para encontrar mão de obra qualificada”, relembra.

A questão da qualificação, inclusive, é um problema da área como um todo. Segundo estudo da Câmara Brasileira da Construção Civil, 90% das construtoras enfrentam este desafio no último ano.

Para Alhadeff, é necessário fortalecer as redes de apoio às mulheres com filhos – o que precisa ser cobrado por profissionais e empresas. “O poder público precisa oferecer creches para a mulher deixar as crianças enquanto trabalha. Há toda uma cadeia que precisa evoluir para oferecer segurança às profissionais para que elas possam trabalhar”, diz.

Outro obstáculo, segundo ela, é a questão dos papéis de gênero repassados durante a educação. “Estes estereótipos são uma questão cultural apresentada durante a vida. Tem que ser feito um trabalho nas instituições de ensino de todos os níveis para ampliar esse horizonte e termos mais referências”, opina.

Inclusive, ela vê este processo já acontecendo. “Tenho três filhos e às vezes falo algumas coisas que eles ouvem e dizem ‘nossa, mãe, que coisa retrógrada’. E já vejo colegas da minha filha dizendo que querem ser juízes, algo que não acontecia na minha época. Então estamos progredindo”, encerra.

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